Os riscos causados pelos raios na pecuária
Um perigo conhecido do produtor rural, os raios são fenômenos naturais que causam grandes prejuízos e até mortes na área rural com maior frequência do que muitos imaginam.
A perda de cabeças do rebanho em decorrência de descargas elétricas é um fato mais comum do que muitos podem pensar. No campo, não é raro tomarmos conhecimento de um ou outro caso de animais mortos na beira de cercas, embaixo de árvores ou mesmo dentro de currais atingidos por raios.
Um fato ainda mais grave é o produtor ter por hábito separar os lotes a serem enviados para o frigorífico e deixá-los em um piquete de fácil acesso.
Pode acontecer de em uma fatídica noite cair uma forte chuva, os animais se recolherem e se reunirem embaixo de uma árvore ou em um canto de cerca para se proteger. Nessa situação, um raio que cair levará em um “estalo” todo o lucro do trabalho de mais de dois anos.
Raios têm um enorme potencial destrutivo
A descarga elétrica pode superar a 100.000 Ampères (A) e a vários milhões de Volts (V), com duração instantânea de alguns milissegundos.
E os bovinos, quadrúpedes, têm por agravante o coração ficar no caminho do raio (entre os membros). Quando este atinge direta ou indiretamente o animal, torna o incidente quase sempre fatal.
Segundo o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), caem anualmente no Brasil uma média de 57,8 milhões de raios. A cada 50 mortes por raio no mundo, uma ocorre em nosso país.
Para quem gosta de loteria eu lembro que, no Brasil, é duas vezes mais provável um indivíduo ser atingido por raio do que acertar na Mega Sena!
Onde os raios caem
O raio é a consequência da descarga elétrica gerada pelo choque entre as nuvens. A atmosfera tem uma grande capacidade de gerar cargas elétricas e quando isso ocorre as descargas são inevitáveis.
Eles também tendem a cair em pontos mais altos do relevo: árvores, morros e torres de igrejas são alguns dos alvos “preferidos” dos raios e, por isso, se repetem em um mesmo lugar.
Só a estátua do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, é atingida anualmente por seis raios, em média. Assim, conhecendo como os raios ocorrem e associando isso ao comportamento dos animais, temos um rico material a ser usado na minimização dos prejuízos causados por este fenômeno natural.
Se houver um terreno descampado, sem árvores ou qualquer cume, um animal ou indivíduo poderá ser o ponto de atração dos raios.
Por isso, se formos surpreendidos por uma tempestade de raios em uma região descampada, a recomendação é deitar no solo e jamais buscar abrigo debaixo de árvores ou próximo a cercas.
Qual o motivo da letalidade mais elevada nos bovinos do que em outras espécies?
Como falamos acima, ao atingir a superfície do solo, a corrente elétrica tende a se difundir radialmente ampliando o seu alcance.
Dessa forma, muitos animais atingidos, na verdade são atingidos indiretamente pelo raio que caiu sobre uma árvore, que estava perto de uma cerca, que conduziu a corrente elétrica e o matou. Parece uma história longa, mas o tempo para tudo isso ocorrer é de um piscar de olhos!
Como adiantado, os bovinos têm como agravante uma tensão de passo entre os membros dianteiros e traseiros maior que a do homem e o coração está no trajeto da corrente de choque, entre os membros. Por isso, é maior a letalidade para acidentes por raios com bovinos do que com outras espécies.
Outro ponto de alerta é que os raios caem durante tempestades e a chuva deixa o solo molhado, e o bovino, em solo encharcado, frequentemente tem parte dos cascos enterrados, criando um excelente ponto de contato com a terra, ou seja: um bom aterramento! Por isso, nessas espécies, com a mesma tensão de passo, a corrente de choque é muito maior.
Para-raios
São excelentes alternativas para as sedes, vilas dos funcionários, currais de manejo e confinamentos. É importante que sejam corretamente instalados em toda a sua extensão.
Ao contrário do que muitos pensam, é melhor não ter um para-raios a ter um para-raios ineficiente.
Existem manuais e regras para a instalação de diferentes tipos de para-raios e a obediência aos manuais é fundamental para evitar acidentes graves. Por isso, a contratação de profissionais habilitados para essa atividade é fundamental.
Isolamento entre mourões
Separar a cerca em pequenos segmentos de no máximo 200 metros é a melhor alternativa. O aumento de custo é mínimo perto da segurança que isso dará ao produtor.
Mas elas exigem bom planejamento e execução. Não pode haver contato entre os mourões pois isso pode interromper o fluxo da corrente elétrica.
A intensão dessa prática é criar várias cercas delimitadas, definindo o alcance da corrente elétrica que, mesmo caindo sobre uma parte da cerca ficará limitada, diminuindo assim o risco de mais animais serem atingidos.
Confinamentos
Projetar um confinamento sem contemplar um bom conjunto de para-raios e um sistema de isolamento das cercas e cochos bem planejados é o que eu chamo de granada sem pino. Nos confinamentos, o isolamento das cercas deve ser ainda menor do que nos pastos.
A pergunta não é se vai acontecer um acidente, mas quando vai acontecer o acidente e qual será o tamanho do prejuízo.
Um para-raios dificilmente vai contemplar todo um confinamento , então é importante o planejamento de um conjunto, uma vez que cada para-raios tem um alcance limitado.
Cada cerca, linha de cocho e demais itens com capacidade de condução elétrica devem ser isolados e seccionados para minimizar a propagação da corrente elétrica.
Aterramento estratégico
O aterramento de pontos estratégicos deve ser estudado, uma vez que, por mais oneroso que seja o investimento, um confinamento é uma indústria de produção proteína animal e toda indústria deve ser minuciosamente planejada, com todos os pontos críticos analisados para a tomada de decisão.
No memorial descritivo de cada planta de confinamento não pode haver supressão à análise de riscos. O planejamento deve ser completo, afinal, é uma indústria ou não é? Deixamos de ser criadores de boi há muito tempo. Hoje somos empresários rurais.
Por Marcus Rezende
Médico veterinário, mestre em Sanidade Animal com MBA em Gestão Empresarial e atual Gerente Regional da Premix